20 de março de 2007

Moral de Baudelaire.


Mas o dia seguinte! O terrível dia seguinte! Todos os órgãos distraídos, cansados, os nervos relaxados, a palpitante vontade de chorar, a impossibilidade de se dedicar a um trabalho contínuo, ensinam-lhe cruelmente que você brincou de uma brincadeira proibida. A hedionda natureza, despida da sua iluminação da véspera, parece melancólicos restos de uma festa. A vontade, a mais preciosa de todas as faculdades, é atacada principalmente. Dizem, e é quase verdade, que esta substância não causa nenhum mal físico, nenhum mal grave pelo menos. Mas acaso podemos afirmar um homem incapaz de ação e bom somente para os sonhos está de fato bem, ainda que todos os seus membros estejam em bom estado? Ora, nós conhecemos o bastante a natureza humana para saber que um homem capaz de obter instantaneamente, com uma colher de geléia, todos os bens do céu e da terra, nunca ganhará a milésima parte mediante o trabalho. Pode-se imaginar um Estado em que todos os cidadãos se embriagariam de haxixe? (...) É fácil perceber a relação que existe entre as criações satânicas dos poetas e as criaturas vivas que se entregaram aos excitantes. O homem quis ser Deus e, em virtude de uma lei moral incontrolável, cai bem mais baixo que a sua natureza real. É uma alma que se vende a varejo.

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